sexta-feira, 22 de abril de 2011

Guest Post: Bara Mangá – A Arte Gay Do Japão



Faz algum tempo que descobri que o post mais acessado do Shoujo Café é um texto bem simples que eu fiz sobre Bara Mangá, isto é, mangás feitos por homens (gays, normalmente) para homens gays no Japão. Não sei se é o título espalhafatoso que eu dei – Mangá para Macho que gosta de Macho – ou outro motivo qualquer, mas o fato é que muita gente chega ao meu blog por este post. Enfim, pedi ao Diego Hatake, a pessoa que eu conheço que mais entende do assunto, para fazer um posto sobre Bara Mangá. Seria um guest post, um dos poucos do meu blog até agora. Bem, o Diego escreveu um texto riquíssimo, que merecia estar em uma revista ou, melhor dizendo, merecia ser lido por muita gente. Muito obrigada, Diego! Espero que as pessoas passem a ler este post, ao invés do outro, ou, pelo menos, passem a visitar o blog do próprio Diego, o Reflections From a Twisted Mind. Segue o texto. Não cortei em duas partes, porque ele merece ser lido na íntegra mesmo.

Bara – A Arte Gay Do Japão

por Diego Hatake

Antes de começar, agradeço ao convite da Valéria para escrever esse texto. Eu não me considero algum especialista em bara como alguns falam. E não, não é falsa modéstia, eu quero muito ser um estudioso da arte homoerótica japonesa, mas sei que ainda há um longo caminho para que eu me considere assim, muito para se ver e ler... Mas sei o suficiente para ser considerado um... fã. Um fã bem curioso, e ansioso por espalhar o que sabe e assim conseguir aprender mais.

Espero que este texto consiga, além de divulgar mais informações para aqueles que já tem certo conhecimento do gênero, que desmistifique algumas ideias que muitos utilizam para diminui-lo. Vamos lá!

Bara: a história

Para começo de conversa, já fique avisado de duas coisas: primeiro, o termo bara atualmente refere-se aos mangás (e também pode englobar todo um universo de produção criativa como fotografia, ilustrações, jogos etc) feitos de homens para homens... gays. Quem achar o assunto “inapropriado” pode parar de ler por aqui. E não, o gênero não é algum desdobramento ou subgênero do yaoi/BL, é algo bem distinto. Ao decorrer da leitura vocês vão saber o porquê.

Aliás, ao estudar as origens de cada gênero já se percebe o quanto são diferentes. O yaoi surgiu basicamente com doujinshis em que as mangakás faziam paródias de mangás shounen – lembrando que já havia histórias de amor entre garotos pipocando no shoujo desde a década de 70. Já o bara tem uma origem um pouco mais antiga. Ora, se pararmos pra pensar, a arte homoerótica existe já há um bom tempo, afinal, é arte! E a arte em si, essa necessidade de “materializar sentimentos e situações”, está aí há tempos, como mostram algumas antigas ilustrações no estilo ukiyo-e, é só pesquisar para ver. Porém, a arte gay moderna que viria a se consolidar como o que conhecemos de bara teve origem na década de 1960.

Reforçando o dito anteriormente, bara é associado ao mangá homoerótico hoje em dia, especialmente no ocidente, mas bara no Japão pode se referir a toda uma produção artística gay, assim como qualquer coisa considerada “gay”. Seria para identificar a possível homossexualidade de algo sem ser muito direto, como dizer que alguém é “entendido”, “fã da Cher”, por aí... Enfim, a alcunha pegou por causa de uma série de fotografias do artista Eikoh Hosoe retratando o escritor Yukio Mishima seminu. O ensaio foi entitulado “Bara-kei” (Provação das Rosas). Futuramente sairiam as revistas Bara (de origem independente) e Barazoku (primeira publicação gay distribuída em bancas), que reforçariam o termo.

A primeira revista que traria ilustradores que posteriormente inspirariam artistas atuais foi a Fuzokukitan, apesar de trazer também conteúdo erótico hétero e lésbico. Todavia, do nativo Go Mishima até Tom of Finland, a arte homoerótica acabou ganhando cada vez mais espaço na revista. Em 1964 foi criada uma revista de circulação limitada chamada Bara, que é considerada a origem de todas as publicações gays subseqüentes. Em 1971 surgiu a famosíssima Barazoku (Tribo da Rosa), que foi a primeira publicação gay mainstream, oficialmente distribuída em bancas. Foi aí que o termo “bara” foi consolidado de uma vez. A revista de mais ou menos 300 páginas tinha todo tipo de conteúdo, até mesmo artigos para o público em geral, pois seu editor Bungaku Itō queria que a publicação não fosse segregada. Apesar de ter pornografia, ela não era considerada uma revista pornográfica, mas seria muita cara de pau negar que grande parte do atrativo da revista eram os romances homoeróticos (um dos publicados foi escrito por Yukio Mishima, utilizando o pseudônimo Tamotsu Sakakiyama), a seção de anúncios pessoais (é sabido, inclusive, que as maiores vendas da revista vinham de locais mais isolados do Japão), e as fotos e ilustrações de homens bem afeiçoados e despidos. Porém, a revista sempre tentava dar foco nos artigos. Para se ter uma ideia, na primeira edição, havia somente seis páginas de foto de nudez. As histórias em quadrinhos apareciam, mas ainda não eram destaque. Com o sucesso desta, outras revistas num mesmo modelo apareceram, como a Sabu e Adon por exemplo.

A coisa mudou com o surgimento de revistas como a Badi e a G-men nos anos 90. A cena gay agora estava mais “à vontade”, e tais revistas surgiram como resposta, já que elas abraçavam de uma vez o rótulo de ser uma “revista 100% gay”. Tratavam de assuntos em comum à cena gay japonesa e mundial, como a preocupação com sexo seguro, divulgação de clubes e lugares gay-friendly, paradas gays... A visibilidade então parece ter sido bem aceita pelos leitores. Outro destaque delas é que ao contrário das revistas como Barazoku, investiu pesado em produções de mangás gays, especialmente a G-men. Esta publicação, inclusive, foi a responsável por mostrar pela primeira vez mangás gays que tivessem continuações (antes as produções eram basicamente oneshot) e por comercializar as primeiras antologias – tankobon – de suas histórias, criando um mercado dos mangás bara.

Consequentemente, publicações anteriores declinaram as vendas e tiveram sua produção encerrada. Os motivos foram vários. A Adon havia mudado sua linha editorial, passou a ter mais artigos políticos, sérios, exterminando os trabalhos eróticos: cavou seu próprio túmulo. A Barazoku ainda resistiu por mais tempo, teve a publicação interrompida por motivos financeiros algumas vezes e se reergueu, três vezes. Porém acabou entrando num beco sem saída: percebeu-se que os anúncios pessoais já não atraiam tantos leitores, já que para isso agora havia a internet. O interesse dos leitores já tinham sido dispersos para as publicações mais novas, e em sua publicação de número 400, teve sua produção encerrada. Ainda assim, a Barazoku é a revista gay de maior periodicidade do Japão até hoje, de 1971 até 2004. Seu legado é inegável.

Mangakás bara em foco

Os artistas que enviavam seus trabalhos para a Barazoku inicialmente se dedicavam a fazer ilustrações, não necessariamente histórias em quadrinhos. Isso veio a acontecer, obviamente, mas primeiramente os desenhistas das revistas ganhavam notoriedade apenas por suas peças individuais de arte.

A Fuzokukitan foi o berço de novos artistas como Go Mishima, Go Hirano e Tatsuji Okawa... Porém pouco podemos falar dos desenhistas dessa geração, só podemos analisar suas obras. A maioria destes artistas são completos desconhecidos até hoje, eles entregavam os trabalhos na editora sem se identificarem formalmente. Creio que não preciso nem dizer o porquê. Para se ter uma ideia, Tatsuji Okawa chegou a ter um relacionamento com Hiroshi Mamiya, um dos responsáveis pela Barazoku. Todos os trabalhos de Okawa eram entregues aos editores por meio de Mamiya. Bungaku Itō nunca chegou a conhecê-lo.

Anos depois, nas décadas mais atuais é que alguns mangakás começaram a assumir seu trabalho. Creio que o que mais se beneficiou com isso foi Gengoroh Tagame, o que mais se expõe atualmente. Mas isso não é privilégio de todos. Outros autores atuais ainda utilizam pseudônimos e evitam ser fotografados, mas na maioria das vezes é mais para se resguardar do que por medo de homofobia. Um caso interessante é o do Jiraiya, que utiliza um pseudônimo por causa de seu trabalho “em escritório”, segundo ele próprio. Imagem ainda conta muito no Japão. Porém, todos eles não hesitam em defender a causa gay.

O estilo dos homens retratados nessas revistas varia muito, de acordo com a segmentação da publicação. Porém percebe-se que na maioria das vezes os desenhos mostram homens de 20, 30 anos... Mesmo que ainda não utilizassem um estilo mais “muscle bear” que é bem comum hoje em dia, a masculinidade era valorizada no traço, com jovens de corpo atlético, e por vezes com pêlos. Essa é uma diferença entre o traço bara e yaoi que é fácil de perceber.

Eu não tenho conhecimento do primeiro mangá bara no “molde” como o conhecemos, como história em quadrinho: a gei comi, mas percebe-se que a Barazoku já os exibia em suas páginas desde os anos 80. A infame história Kuso Miso Technique de Junichi Yamakawa é um exemplo.

Gengoroh Tagame é sem dúvida o mangaká bara mais conhecido, por inúmeras razões. Seja por ser um grande estudioso da arte homoerótica do Japão, dando palestras em universidades e por ter livros sobre o tema publicados; seja por ser um dos autores de mangá bara que mais tem volumes publicados pelo mundo afora, trabalhando desde meados da década de 80; seja pelos temas pesadíssimos que trata em seus mangás. Sério, quando alguém diz que um mangá do Gengoroh Tagame é algo para pessoas de estômago forte, não é mentira. Outro artista bara, Susumu Hirosegawa inclusive declarou que as histórias do Tagame não são profundas, chamando-as de “teatro sadomasoquista”. Por vezes, algumas histórias do Tagame chegam mesmo a apresentar um plot mais fino que papel de seda, e devo concordar que muitas histórias dele são apenas explorações de temas hardcore, mas é um dos artistas top em se tratando do traço.

Outros mangakás bastante conhecidos por lá e no ocidente são: Jiraiya, praticamente um discípulo do Tagame - mas que tem histórias bem melhores e mais agradáveis - que já tem mangás publicados na Espanha. Takeshi Matsu, que até onde sei não teve nenhum mangá publicado em outro lugar além do Japão, mas ele é sem dúvida um dos autores mais lembrados de bara, talvez só esteja abaixo do Tagame em questão de popularidade. Tsukasa Matsuzaki foi um mangaká de BL antes de migrar para as revistas gays, e tem vasta coleção de tankohons publicados, alguns ele divide a autoria com o Matsu. O já citado Susumu Hirosegawa também migrou do BL para o bara, e suas histórias focam bastante no plot.

Além destes, podemos destacar também os seguintes artistas (de mangás ou apenas ilustrações), seja desta ou de gerações mais antigas: Sadao Hasegawa, Bem Kimura, Inaki Matsumoto, Shunpei Nakata, Mentaiko, Shotaro Kojima, Ichikawa Kazuhide, Satoru Sugajima...

Bara e yaoi: duas visões de um mesmo amor

Chegamos então ao ponto mais polêmico da história. Mangá bara e mangá yaoi ainda são frequentemente confundidos. Já vi muito scanlation de yaoi que tem alguns bara disponíveis em seu acervo, já me deparei com muitos blogs com conteúdo exclusivo bara que os chama de “yaoi bara”. Mas eles tem sim suas diferenças, desde o traço até o conteúdo das histórias. Eu mesmo confundia o tempo todo, só depois que fui entender, normal, e nem é algo para se condenar ou xingar alguém.

Eis o que acontece: o bara é feito em sua maioria por homens homossexuais e são dirigidos para homens homossexuais enquanto o yaoi é feito por mulheres e suas leitoras são mulheres. É algo bem distinto, geralmente os gays japoneses rejeitam o yaoi, assim como algumas mulheres não apreciam muito os mangás bara. Os motivos para isso são vários, atrelados às diferenças dos mangás. Embora cada mangá tenha seu “estereótipo”, é bom ter consciência que às vezes acontecem exceções, mas basicamente tais mangás seguem sempre esse padrão que a maioria conhece.

Enfim, eis algumas características de mangás yaoi e bara em comparação:
Físico dos personagens – Essa é a diferença que mais “grita” ao verificar os mangás. O yaoi preza por mostrar homens de físico bem esguio. Magros, esquálidos. E muitas vezes alguns chegam a ser andróginos mesmo. Isso se explica pelo fato que esse é o tipo físico que mais atrai as mocinhas japonesas – vide os idols. Já o bara ressalta a masculinidade: muito pêlo, muito músculo, muito tecido adiposo em certos casos. Outra diferença é no detalhamento desse físico. Enquanto um pênis é desenhado de modo bem simples no yaoi (e mesmo que às vezes nem pareça um, é censurado de modo absurdo), no bara os detalhes são indispensáveis. O mesmo para a parte “traseira”, que eu raramente vi desenhada em yaoi, mas aí não sei se é censura ou omissão mesmo.
Plot – É aí onde muitas leitoras de yaoi defendem sua rejeição ao bara. O bara, por se encontrar quase sempre em uma revista adulta erótica (falo isso em consideração aos que produzem direto em seus sites), obviamente foca na relação sexual dos personagens. E por a sua maioria ser apenas curtos oneshots, não há muito espaço para se desenvolver uma história mais profunda entre os personagens. Mas esse fato não quer dizer que todo mangá gay seja raso. Ou que todo yaoi seja tão profundo e bem desenvolvido. O BL naturalmente emula muitas “firulas” do shoujo – as “pausas dramáticas”, por exemplo – já que o BL é uma parte desse gênero, já o bara é mais direto na “ação”.
Sexo – Acho este um ponto que merece discussão também para complementar a informação acima. O sexo no bara, por ser destaque, é desenhado com ricos detalhes, e me perdoem se beiro o exagero, mas às vezes é até mais do que um hentai... Isso talvez assuste as mulheres que não se interessam tanto pela estimulação visual, ao menos isso que é descrito por algumas. O mangá yaoi quando tem cenas de sexo não as mostram com tantos detalhes, às vezes nem as mostram, só dão sugestões. E enquanto no yaoi a cena de sexo é uma “refeição completa”, no bara isso não acontece. No bara, não precisa nem ao menos ser na cama, e pode muito bem se resumir à masturbação ou preliminares.
Visão do amor homossexual – Aqui é onde reside A grande diferença. E se o plot raso é a queixa favorita das moças, o retrato dos homossexuais é objeto de enorme crítica dos gays. Comecemos com o padrão do mangá yaoi de mostrar em seu casal um seme (ativo) e uke (passivo) do tipo “até a morte”, e mostrando o uke com um visual mais andrógino: tal manifestação acaba sendo uma representação de um amor heterossexual. Em muitos mangás yaoi se encontra um personagem que nunca se identifica como homossexual, o que piora a situação. Além disso, poucas são as situações, expressões ou trejeitos que possam ser identificadas de fato pela cultura queer. É algo que soa, por mais que as intenções tenham sido boas, meio falso... sabe quando se assiste um filme sobre o Brasil sendo que a ótica é 100% americana e o brasileiro não se vê naquele filme? É isso que acontece. No bara se trabalha melhor a apresentação de uma vida gay, suas agruras e prazeres. Em um exemplo bem fácil de se ver: os papéis de ativo/passivo quase sempre são rejeitados, com o casal mostrando-se basicamente versátil. E nem sempre o casal precisa se amar para ficar junto. Sexo no bara não significa necessariamente “amor consumado”, como no yaoi.
Interessante observar que, se existe tamanha crítica entre algumas pessoas, algumas se preocupam em ler os dois mangás sem muita preocupação. Percebe-se no Brasil, por exemplo, que quando o yaoi foi descoberto e começou a se popularizar, o público de homens e jovens homossexuais que liam as histórias sempre foi grande, não há uma rejeição como acontece no Japão, por exemplo, onde até mostrei em meu blog uma introdução de uma história do Jiraiya em que ele se desculpa por fazer uma história muito romântica – ou seja, “para mulheres”. O bara tem pouquíssimo tempo de exposição no país, e possivelmente só chegou aqui porque alguém achou que fosse apenas mais um tipo de “mangá yaoi”. Parece-me que agora que tais termos são devidamente conhecidos e explanados, esse grupão que gostava dos “mangás com casal gay” acabou se separando um pouco. Mas acho que a própria exposição do público aos dois acabou fazendo isso, pois suas diferenças não passam despercebidas. Daí, cada um parte para o que mais gosta.

Porém isso não quer dizer que um gênero é melhor que o outro, ou que sirva para discriminação. Uma coisa que acontece hoje que irrita muitas fãs de BL é quando a mídia gay se apropria do mangá yaoi, deixando de citar que quem cria as histórias são mulheres e que esse é o seu público majoritário. A misoginia também é observada em alguns que, por preferirem histórias de conteúdo mais lascivo, taxam as histórias bara mais leves como “mangá de mulherzinha”. E da mesma maneira acho que tratar os mangás bara como algo menor por não ter muita profundidade seja algo injusto, já que eles têm grande significância para homossexuais pela verossimilhança. É uma expressão legítima nossa, e de certa forma acho desrespeitoso no sentido que muitos manga-kás bara se esforçam para fazer histórias com profundidade, sim! Sabe-se que as editoras das revistas viram que as histórias continuadas trazem um público fiel, ansioso por acompanhar seus personagens favoritos. Quanto ao tipo de traço ou de físico que é mostrado, “esse físico é mais bonito, esse não”, aí é algo muito subjetivo, e, portanto nem vale a pena discutir por longo tempo.

E repetindo o que disse, essas “regras” têm suas exceções. Existe, por exemplo, o mangá conhecido como “gachi muchi”, que é um BL construído com personagens de físico mais masculino, mais parecido com o utilizado no bara. Tal mangá tem autores gays, e é dirigido para mulheres, embora tenha um bom número de leitores homens gays. E no gei comi podemos destacar Tetsuzo Okadaya, que apesar do pseudônimo masculino, é uma mulher, e já teve vários trabalhos publicados nas revistas gays, como a G-men.

Nota-se que no Brasil já tenha uma breve noção dessa diferença, mas mesmo quando o bara estiver bem difundido, acho que vai ser difícil ocorrer grande segmentação entre o público. Na pesquisa que a Tanko, administradora do site Blyme, fez sobre o yaoi, uma pesquisa sobre o bara constava que 41% do público do site – maioria de pessoas do sexo feminino – não compraria uma publicação bara. Mas há de se observar que as opções com “Sim”, mesmo que com ressalvas (“...eu prefiro yaoi ao bara”, “...só se for um título/autor que eu goste”), juntas representam 56%. E considerando justamente essas ressalvas, observa-se que o público fujoshi mostra-se aberto, assim como alguns homens gays – o responsável por esse texto, por exemplo – acham divertido ler BL. No fim, a questão não é de qual é melhor, ou mais bem sucedido, é simplesmente questão de escolha e identificação. Ambos são mangás, e ambos estão disponíveis a qualquer leitor.

Bara no Brasil???

Para encerrar, a grande questão: seria possível uma editora se interessar em publicar uma gei comi no Brasil? Bem, seria algo difícil, MUITO difícil considerando a indústria editorial brasileira hoje, mas não impossível.

O grande empecilho na publicação do bara em outros países é justamente suas histórias. É óbvio que um país onde pessoas são tratadas como inferiores por sua sexualidade não encara ainda muito bem peças homoeróticas explícitas, por mais que elas estejam lacradas e bem no alto das prateleiras de livrarias ou bancas. Vide o número baixo de revistas direcionadas ao público homossexual e a resistência que elas encontram para ser vendidas até hoje em determinados locais.

E para se ter uma noção, nos EUA, onde as vendas do BL são fortíssimas, até onde saiba, no momento não houve nenhuma publicação bara. Grande parte do público dos Estados Unidos fã de bara depende de scanlations. Mas na Europa alguns mangás do tipo já foram publicados oficialmente, como Espanha, Itália, França... e em sua maioria foram em edições de luxo. Falando nisso, esse talvez seja outro empecilho, de fato determinadas obras, especialmente as do Gengoroh Tagame, não tem um padrão ideal para ser vendido em banca, no formato revista comum (aquele impresso em “papel jornal”), e uma edição de luxo, geralmente direcionado a colecionadores, obviamente encareceria o produto que, por ora, já pertence a um público “restrito”. E embora seja “restrito” isso não quer dizer que o público não esteja disposto a pagar. Sabe-se muito bem que o público gay costuma apoiar os produtos dirigidos para sua comunidade (aquilo que no mundo dos negócios chamam de “pink money”). Enfim, a publicação de gei comi no Brasil é algo que ainda pode ser explorado algum dia, só espero que esse dia não demore demais. Eu aprecio muito os mangás em geral, e ter em mãos um mangá que represente algo que surgiu de alguém “entendido”, alguém com quem compartilho gostos, me identificar, é algo imensamente agradável.

Enfim, acredito que essas publicações ainda aparecerão no Brasil, seja nas mãos de editoras de mangás já conhecidas, ou por trabalho independente da comunidade gay mesmo. Enquanto isso, faço meu trabalho de formiguinha divulgando mais o gênero, para que, quem sabe, “esse dia” possa chegar.

16 pessoas comentaram:

Nossa o autor escreveu de modo tão gostoso e fácil de ler.
Parabens

Realmente o Diego escreve muito bem. Ler este texto foi muito prazeroso. Leio mangás bara, mas não conhecia a sua história, logo, este texto foi muito esclarecedor.
Já li vários baras, mas sempre fico mais curioso com os trabalhos do Jiraya e principalmente do Takeshi Matsu que tem uma arte incrível aliado as estórias safadas e as vezes até fofas ^___^.
Quando conheci o yaoi/BL senti aquela carência que qualquer homem gay sente quando não se sabe nada sobre o estilo: A falta identificação, já que, como bem dito no texto do Diego, casais BL lembram muito casais heterossexuais. Descobrir o Bara foi muito bom por esse lado, mas também senti a carência de ler estórias com mais profundidade, apesar de já ter encontrado material que chegou perto disso.
Hoje em dia sou fã dos dois estilos e não critico mais o que antes eu considerava defeito e sim aproveito tudo de bom que eles oferecem, além de achar a história por trás desses estilos muito interessante.
Agora, quando se trata de preferência em HQs gays, assumo que os gloBL se tornaram minha nova paixão. Nessas HQs eu encontro cenas românticas, profundidade nas personalidades e cenas de sexo explícito. Aliás, recomendo muito um gloBL chamado STARFIGHTER, um sci-fi gay delicioso.
Enfim, todos são estilos maravilhosos e merecem uma olhada SEM PRECONCEITOS!

O Diego superou qualquer boa expectativa que eu tivesse. Aprendi bastante com o texto e, sim, ele escreve muito bem. Espero que ele faça uma bela carreira, seja como jjornalista ou como o que ele escolher. :)

Eu adorei o texto extremamente explicativo. Obrigada ao Diego pelo texto e a Valéria pela oportunidade dada. Eu aprendi muito com as informações.

:D

Só depois de muito tempo que fui descobrir o Bara mangá, e foi aqui no shoujo café mesmo. Achava que os mangás gays se resumiam a Yaoi.

Ainda bem que o Bara está sendo difundido. Novos blogs estão sendo criados.

Olá,Valeria!

Gostaria de saber o por quê de meu comentário não ter sido publicado?

Obg! ^^

R, não publiquei o seu comentário, porque o considerei muito mais agressivo do que construtivo. Ele está salvo aqui "Pelo que já sabia e pelo que li,o bara nada mais é do que um material pra lá de pornográfico feito por gays que pensam que sexo é tudo na vida!

Cadê o romantismo,a complexidade dos personagens...cadê o conteúdo? o O"


Sinceramente? Eu modero todos os comentários exatamente para decidir o que entra e o que não entra. Eu particularmente não vejo nenhuma diferença consistente entre Bara/Hentai/Yaoi. Há material para todos os públicos e não são somente os (homens) gays que pensam sem sexo ou constróem produtos de nicho extremamente pornográficos. Mulheres e Homens hetero também fazem isso.

De resto, os seus comentários no post da CLAMP também não foram aprovados por mim. Piadas com Lula em post da CLAMP, não tem função, e a velha reclamação em relação à X é algo muito cansativo MESMO.

A matéria ficou excelente! parabéns, Diego!

Há uma enorme diferença entre os três dos quais você citou.Já li alguns yaois muito lindos,que demorava páginas e mais páginas até o "casal" ter alguma relação sexual.Hentai e o Bara,não.Só estão preocupados em retratar o sexo e NADA mais que isso.

Sobre os comentários no post da CLAMP e todo o restante do blog,faça como quiser,ele é seu e você é quem manda.

Obrigado pela justificativa!

R, pela forma como você coloca, devo supor que você tenha lido muito dos três gêneros. Agora, eu já vi yaoi que abre com sexo na primeira página, mas eu não vou generalizar como você está fazendo. Já vi hentai com histórias elaboradas, mas eu percebo que a maioria do que aparece na net não é assim. O que Hentai e Bara têm em comum? Wão feitos por homens para homens. Percebe que essa diferença possa pesar dentro das histórias? Aliás, foi isso que o Diego explicou e muito bem. Fora isso, há material pornográfico feito por e para mulheres que é somente sexo, ainda que o tal "romantismo" (*eu não vejo nenhum em estupros consentidos, mas há quem veja, só para citar exemplo*) esteja muito mais presente do que em materiais para homens, sejam hetero ou gays.

O que me incomoda é o preconceito (*não deve ser o seu caso, pois suponho que você deva ter lido centenas de títulos de cada um dos gêneros*) e rotular as coisas e as pessoas, no caso, so gays.

Fui mal interpretado,com toda certeza!

Não estou rotulando nada,apenas quis expor minha opinião sobre a o gênero Bara.Não ia jamais me discriminar.HAHA.Sou gay e não gostei de algumas colocações do Diego,como essa por exemplo:

"Eu aprecio muito os mangás em geral, e ter em mãos um mangá que represente algo que surgiu de alguém “entendido”, alguém com quem compartilho gostos, me identificar, é algo imensamente agradável."

Realmente é muito agradável saber que quem fez aquilo era "entendido" ,mas isso não significa que o autor traduzirá a verdade.E era essa a verdade que vi no Bara.Nada mais que pornografia.[[Isso é ruim?Não sou hipócrita em dizer que sim,porque não é.Mas acho que com um conteúdo a mais seria melhor.]]

Espero que tenha entendido,e desculpe pelo transtorno! ^^

"Já li alguns yaois muito lindos,que demorava páginas e mais páginas até o "casal" ter alguma relação sexual.Hentai e o Bara,não.Só estão preocupados em retratar o sexo e NADA mais que isso."

Jiraiya - Shrine Festival Sumo (essa só tem beijo), A Promise (essa nem beijo tem!), Umihiko e Yamahiko, Undercover Lover, Blue Fragrance, Aogeba Totoshi.
Mentaiko -Itai Itai Itai (3 partes, ainda está sendo produzido).
Takeshi Matsu - Courier Spirits, Do You Know My Name, Four Seasons, More and More of You (quatro parte, o quinto e último capítulo vai sair em breve), Shallow Dream, Tai-chan Kou-chan, Don't Call Me Rube, Go Ahead! Riku Kai Kuu, Since The Day We Met (essa tem até o velho clichê de mangá do estudante valentão que mostra afeto por um bichinho, olha que coisa!).

Algumas dessas tem sexo sim, às vezes acontecendo em fantasia, masturbação, e talvez uma nudez, mas acho que isso não ofende muito, né? Creio que todos aqui são adultos e não tem neuras de falar da sexualidade humana. ;)
Mas por ora procurem ler essas aí e me digam se não há uma história.

Sou mulher e gosto de ambos.

Eu até leio Yaoi de vez em quando, mas sempre os leio como se fosse um "Conto de Fadas"... realmente eu, que já namorei homens DE VERDADE e tenho amigos gays sei que aquilo não passa de um relacionamentozinho água-com-açúcar de um homem e uma mulher.

Existem alguns bara que são mais "sensíveis", como muitas obras do Jiraya (IDALO!!) que mostram relacionamentos mais profundos. E eu adoro isso!

E quanto à procura destes dois generos por pura sacanagem... bem, yaoi NÃO funciona! Pois tudo que vejo é uma relação meio´lésbica. Baras funcionam melhor neste sentido... se entendem oq ue quero dizer :P

Demorou(foi minha diversão da tarde, eu garanto) mas traduzi(uma parte da versão inglesa) falando do Bara no Wikipedia.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Bara_(gênero)

Se a admistradora do Shoujo Café autorizar, gostaria de recomendar que colocassem o link nas Fontes, visto que também há o conteúdo original do post inglês :)

Estou lendo a matéria pela primeira vez devido a referência feita no post sobre a premiação recebida por Gengoroh Tagame e Go Nagai.
Não conhecia o Bara mangá e confesso que foi uma felicidade a mais: mais diversidade e possibilidades no universo de mangás, o que considero maravilhoso.

Felicito o autor do texto, muito bem escrito - como elogiado nos outros comentários. Parabéns.

Acho que o universo de mangás com abordagem de relações homoafetivas precisava deste viés mas erótico e bem trabalho (sob outros aspectos artísticos) - ainda acho que o material "direcionado" ao público adulto hetero (em especial o feminino) também precisa de mais materiais com essa abordagem.
Obrigada pela partilha de conhecimento. Ótimo post.

Uma coisa que me deixa com um pé para trás com o bara, é que nem sempre os homens são como retratados ali, como eles usam o fato de yaoi sempre representar personagens mais magros, o que significa (na mente de alguém sem inteligência) mais feminina, se eles mesmos só apresentam personagens super estereotipados que eu garanto que deixam de representar mais da metade dos homens? Totalmente sem sentido

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